Policiais dão as mãos em frente ao Quartel-General da Polícia Militar, no centro do Rio de Janeiro, no momento em que dois PMs se entregaram. Eles tiveram a prisão decretada por serem considerados líderes da greve
Foto: Marcus Vinicius/Terra
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A deputada estadual Janira Rocha (Psol-RJ), que corre o risco de ter o mandato cassado após a divulgação de escutas telefônicas em que incitaria a greve de policiais e bombeiros do Rio de Janeiro, disse nesta sexta-feira que não se arrepende da conversa que manteve com o cabo bombeiro Benevenuto Daciolo e que teria "orgulho" em ser cassada por "bandidos".
"Esse processo de julgamento é, antes de mais nada, uma ação política. Se a população do Rio ficar majoritariamente a favor da causa dos policiais e bombeiros, vai ser difícil ficar contra a vontade popular e me cassar", diz Janira. "O resultado tem a ver com a correlação de forças que for estabelecida na sociedade. Mas não vou mover minha ação política pelo medo de ser cassada. Se isso acontecer, vou ter orgulho de ser cassada por uma corja de bandidos ao defender os trabalhadores. No meu modo de ver, essa gente é guiada por interesses escusos dentro do Estado."
A parlamentar afirma, no entanto, que não incentivou os grevistas a cometerem qualquer ato ilícito e criticou a "edição da gravação feita pela TV Globo". "Meu trabalho é político, discuto politicamente com o comando do movimento sobre as melhores táticas a serem adotadas. Na mesma gravação, eu deixo bem claro que considero abominável qualquer ato de vandalismo ou uso de armas, mas esse trecho foi cortado pela Globo."
Segundo Janira Rocha, que acompanhou os 11 líderes do movimento grevista presos na manhã desta sexta-feira, o governo está colocando em risco a integridade dos grevistas presos. "Olha só o tipo de coisa que esse governador está fazendo: ele pega policiais e os coloca no mesmo presídio em que diversos bandidos que eles prenderam durante anos cumprem pena. É uma tortura indireta. A chance de uma tragédia acontecer é imensa", alerta.
Janira afirma que o próximo passo na defesa dos policiais e bombeiros vai ser buscar revogar a prisão na Justiça. No entanto, ela acredita que será preciso buscar os tribunais superiores em Brasília. "Temos uma reunião com a Comissão de Direitos Humanos da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio), familiares dos presos e a Defensoria Pública para buscar caminhos jurídicos para este impasse. Estamos achando que, como existe um verdadeiro estado de excessão no Rio, está tudo montado para transformar a greve em um grande crime. Vamos tentar os tribunais superiores, onde temos maior chance de sucesso. E, na verdade, o que está acontecendo aqui tem que ser discutido nacionalmente."
A deputada elogiou a postura do colega Wagner Montes (PR-RJ), apresentador da Record. Segundo ela, Wagner conseguiu mostrar a realidade da situação. "Gostei muito do programa de hoje do deputado Wagner Montes. De um lado, a Globo está dizendo que está tudo bem. Mas não adianta a mentira. Ele entrevistou o relações públicas da Polícia Militar, coronel Frederico Caldas, que dizia que não houve adesão e minimizava o movimento. Ao mesmo tempo, mostrava imagens da mobilização na Cinelândia, da carreata pelas ruas da cidade e dos quartéis lotados."
A parlamentar acredita que essa é a oportunidade ideal para que a sociedade discuta os rumos que as polícias devem tomar. "Se a sociedade, principalmente nossa classe média hipócrita, quer viver com segurança, precisa assumir sua responsabilidade e confrontar a polícia ideologicamente. Precisamos de instituições modernas e democráticas. O Estado está introjetado nas pessoas essa concepção de Estado punidor, que controla socialmente, o Estado do vigiar e punir está lá. Isso não se reflete só pela ordem dos oficiais, isso está dentro dos próprios praças", afirmou,acrescentando que é preciso "largar de vez o ranço da ditadura". "É como se existisse uma formação que diz assim: 'desconfie do pobre'. Se ele está vestido com aquele boné, camiseta surrada, ele já é bandido. É só achar uma prova material. É essa a polícia cheia de preconceito que queremos?", questiona.
A greve no Rio
Policiais civis, militares e bombeiros do Rio de Janeiro confirmaram, no dia 9 de fevereiro, que entrariam em greve. A opção pela paralisação foi ratificada em assembleia na Cinelândia, no Centro, que reuniu pelo menos 2 mil pessoas.
A orientação do movimento é que apenas 30% dos policiais civis fiquem nas ruas durante a greve. Os militares foram orientados a permanecerem junto a suas famílias nos quartéis e não sair para nenhuma ocorrência, o que deve ficar a cargo do Exército e da Força Nacional, que já haviam definido preventivamente a cessão de 14,3 mil homens para atuarem no Rio em caso de greve.
Os bombeiros prometem uma espécie de operação padrão. Garantem que vão atender serviços essenciais à população, especialmente resgates que envolvam vidas em risco, além de incêndios e recolhimento de corpos. Os salva-vidas que trabalham nas praias devem trabalhar sem a farda, segundo o movimento grevista.
Policiais e bombeiros exigem piso salarial de R$ 3,5 mil. Atualmente, o salário base fica em torno de R$ 1,1 mil, fora as gratificações. O movimento grevista quer também a libertação do cabo bombeiro Benevenuto Daciolo, detido administrativamente na noite de quarta-feira e com prisão preventiva decretada, acusado de incitar atos violentos durante a greve de policiais na Bahia.